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Sistema de ensino português agrava desigualdades sociais

O sistema de ensino em Portugal discrimina os alunos por escolas, por turmas e por vias de ensino, agravando os processos de desigualdade social, revelam as conclusões de vários estudos do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE).

No âmbito do Fórum de Pesquisas CIES (Centro de Investigação e Estudos de Sociologia) 2006, este ano dedicado às temáticas da Sociedade do Conhecimento, Jovens e Educação, investigadores do ISCTE vão apresentar os resultados mais relevantes da investigação feita nesta área nos últimos anos.

A divisão de turmas segundo o desempenho escolar e a origem social dos alunos e a selecção de estudantes definida com base nestes critérios por parte de escolas situadas na mesma zona são realidades identificadas nas pesquisas que os investigadores consideram contribuir para o aumento da “‘guetização’ social”.

Há escolas de elite e escolas que marginalizam

No estudo “Políticas de Educação Básica, Desigualdades Sociais e Trajectórias Escolares”, realizado no ano passado, foram analisadas quatro escolas públicas que evidenciam diferenças acentuadas a nível da origem social e desempenho escolar dos alunos, assim como da qualidade dos equipamentos, apesar de se situarem a pouca distância umas das outras – na zona Norte de Lisboa, entre o Lumiar, Carnide e Telheiras.

Numa das escolas do 2º e 3º ciclos que foram analisadas, os estudantes pertencem maioritariamente a classes sociais elevadas, apresentam um bom desempenho escolar e beneficiam de equipamentos novos, enquanto noutra os alunos são sobretudo de classes desfavorecidas, registam altas taxas de reprovação e usufruem de equipamentos escolares degradados.

No primeiro caso, a percentagem de alunos que chumbaram mais do que uma vez é de apenas sete por cento, um valor que dispara para os 49 por cento na escola frequentada sobretudo por alunos de classes desfavorecidas.

A taxa dos que nunca chumbaram é igualmente esclarecedora, situando-se nos 82 por cento na primeira escola e em apenas 33 por cento na segunda.

“Sendo todas públicas e situadas na mesma zona, há escolas de elite e outras de crianças quase marginalizadas. Toda a gente quer pôr os filhos nas escolas com melhores alunos e essas acabam por ter mais candidatos do que vagas, o que lhes permite seleccionar os estudantes e excluir os repetentes ou os provenientes de um bairro social, por exemplo”, explicou Pedro Abrantes, um dos investigadores responsáveis do painel Diversidade e Desigualdade nas Escolas.

Estudo de 2001 detectou mesmos factores de desigualdade

Uma outra pesquisa, realizada em 2001, analisou a constituição de turmas na mesma escola, desta vez situada num bairro desfavorecido do concelho da Amadora, tendo sido identificados os mesmos factores de desigualdade.

Alunos de classe média com trajectórias escolares de excelência eram todos agrupados nas mesmas turmas, sendo as outras constituídas por estudantes provenientes de um bairro social e com um fraco desempenho escolar.

“Até aos anos 70, 80 a maioria dos jovens não frequentava a escola a pa rtir do primeiro ciclo, à excepção dos pertencentes a classes sociais elevadas. Hoje a escola pública acolhe todos, mas de forma muito diferenciada”, sublinhou o investigador, considerando que “os estudos apontam claramente para uma evolução da ‘exclusão da escola’ para a ‘exclusão na escola'”.

Já no que diz respeito à violência nos estabelecimentos de ensino, as diferenças na origem social dos alunos deixam de ser significativas, segundo as pesquisas, que concluem que o fenómeno “não ocorre em mais quantidade nas escolas onde existe mais insucesso escolar ou com maior diversidade cultural e étnica”. 

“Os estudos relativos a essa matéria ainda não estão terminados, mas permitem já concluir que há factores como a qualidade dos equipamentos e a estabilidade do corpo docente e do conselho executivo que são mais determinantes a nível da violência”, adiantou o responsável do CIES. 

Lusa, 6/12/2006

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