Domingo, Dezembro 22, 2024
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Paradoxos da Secretaria da Educação

Há algum tempo li, com agrado e admiração, no Açoriano Oriental, algumas declarações da Exma Directora Regional da Educação, onde refere a intenção de criar centros de audiovisuais e multimédia nas escolas, para que estas possam produzir trabalhos. Dando o benefício da dúvida, esperei para ver se algo se concretizava, porque as iniciativas de dinamização e apoio à acção pedagógica das escolas são tão poucas que já estou como S. Tomé “ver para crer”. Só que o tempo passa e, infelizmente, se não fosse a promoção de alguns eventos por outras Direcções Regionais, que não a da Educação, continuávamos a ver muito pouco.
O projecto anunciado merece, certamente, a concordância de todos os professores, da comunidade educativa e a minha, em particular, porque, durante muitos anos, “lutei” para que esta realidade se concretizasse na prática, embora, até ao momento, nunca tenha visto da parte da actual Secretaria da Educação qualquer empenho nesse sentido. Se algo há a registar, foi uma total indiferença no que respeita à importância da comunicação audiovisual e multimédia no processo ensino-aprendizagem, que se traduziu na desvalorização, abandono e menosprezo por todo o trabalho feito neste domínio, exceptuando a distribuição de computadores avulsos pelas escolas, decorrentes de projectos do ex-Ministério da Ciência e Tecnologia, sem qualquer plano de formação e acompanhamento dos professores, o que fez com que muito deste equipamento permanecesse durante largo tempo encaixotado ou encostado às paredes, sem contribuir para o fim a que se destinava.
Confesso a minha admiração ao dizerem que vão criar centros de recursos nas escolas, com capacidade para produzir trabalhos, quando abdicaram da tutela do único centro de recursos que dispunham com capacidade para tal –  o ex-CATE. Será que têm verdadeira noção do que estão a dizer quando se fala em produção de documentos desta natureza? Será que têm consciência dos recursos humanos e técnicos que isso implica? Se, na realidade, pretendem criar e dinamizar tais centros, como é que se explica que o Sr. Secretário Regional da Educação e Cultura tivesse, recentemente, acabado com as míseras duas horas de redução semanais atribuídas ao Director do Gabinete de Meios Audiovisuais das Escolas, admitindo que tal responsabilidade possa ser desempenhada por pessoal não docente? Não será isto um paradoxo?
Sempre defendi a importância do registo das actividades escolares, sobretudo os projectos mais relevantes, como forma de perpetuar no tempo um património de enorme relevância pedagógica, educativa, social e cultural, para que as nossas escolas pudessem ter história e memória, não só unindo afectivamente as várias gerações como, também, projectando, através de permutas, intercâmbios e concursos, no espaço regional, nacional e até internacional as marcas da nossa identidade cultural. Foram da ordem das centenas os trabalhos registados e produzidos pelo ex-CATE, envolvendo escolas de todos os níveis de ensino, cuja qualidade pedagógica e técnica dignificou a Região além fronteiras, arrecadando primeiros prémios, menções honrosas e até louvores em concursos nacionais e internacionais, de que recordo o concurso ?Audiovisuel et École?, onde o trabalho das nossas crianças e professores mereceu o prémio especial do júri em Bruxelas.
Há tempos que marcam, sobretudo aqueles onde a preocupação do fazer estava primeiro que a do publicitar, onde se sucediam os concursos denominados Contos e Cantos, Histórias e Canções Infantis, Danças e Bailinhos, Videogramas Escolares, onde se faziam colectâneas de documentos sobre a Região, intituladas Os Açores no Mundo, onde se promovia a banda desenhada, onde se faziam projectos, em vídeo, de elevada qualidade, tais como: Roteiro dos Museus Açorianos, Concelhos dos Açores, Açorianos de Cultura, série esta que mereceu divulgação televisiva, entre outros, que marcaram presença significativa em exposições regionais, nacionais e, de modo particular, nas nossas comunidades, aquando dos Encontros de Cultura Açoriana.
Tudo isto passou à margem da sensibilidade da Secretaria da Educação que, em vez de estimular e apoiar esta dinâmica, a ignorou e desvalorizou. No entanto, acena-se com a bandeira da Regionalização do Ensino e os professores, mais uma vez, que se desenrasquem como puderem, que estejam atentos à programação televisiva para irem registando nos seus vídeos excertos de programas culturais, ou até que comprem dois vídeos e quiçá uma mesa de mistura para fazerem pequenas montagens de modo a que os conteúdos se ajustem aos programas da sua disciplina, em suma, que sejam eles os ?piratas?, porque o Estado, zeloso dos seus direitos, não o quer ser. Que não o seja, acho muito bem, mas então que os produza, que os compre, ou, no mínimo, que faça protocolos com as diversas estações de televisão, inclusive com a RTP Nacional e Regional, que vive, em grande medida, de dinheiros públicos, e cujos arquivos poderiam ser um contributo valioso ao serviço da Educação. Eu nem falo de outras tecnologias porque, apesar do que se diz, são contadas as salas de aula que dispõem de computador, a não ser para os alunos da área tecnológica. Não basta dizer, como afirmou o Sr. Secretário, que “há que repensar as metodologias na sala de aula, que é importante debaterem-se as questões de natureza pedagógica, porque culpa-se o tempo de aulas e não o que se faz na aula”.
Até a revista de acção educativa INFORMAR, com mais de uma década de existência, espaço de cruzamento de ideias e experiências pedagógicas, que, além do mais, seria de enorme relevância para a história da Educação nos Açores, foi condenada ao seu desaparecimento com uma indiferença confrangedora, cuja falta nem passou despercebida à Comissão Regional de Desenvolvimento Curricular. Idêntica sorte teve a Mediateca Móvel, indo ao encontro das escolas mais distantes e das crianças com menos recursos e oportunidades. Não obstante, os professores são sempre os culpados do estado em que a Educação se encontra. É bom que se tenha em consideração a mensagem de Sua Excelência o Presidente da República, dirigida ao 8º Congresso Nacional dos Professores: ?É possível pedir muito aos professores, mas não é possível pedir-lhes tudo? e acrescentou: ?Não é justo exigir aos professores mais do que eles podem dar?.
Com tudo isto, chegamos à triste conclusão que a Secretaria Regional da Educação já não tem capacidade para gerir ou tutelar os serviços cuja acção se desenvolve, dominantemente, no seu âmbito de competências, tendo-se deixado ultrapassar por outras instituições que conseguiram criar, fora da escola, espaços tecnológicos de pesquisa, lazer e entretenimento muito mais atractivos, para as crianças e jovens, do que aqueles que a escola oferece para as suas aprendizagens curriculares. Não será mesmo um paradoxo?. Depois admiram-se da desmotivação dos alunos pela escola!

Armando Dutra

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