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Diáspora: 100 000 deixaram Portugal em 2006

O Instituto Nacional de Estatística (INE) diz que, em 2006, 30 mil portugueses fixaram residência por mais de um ano noutros países, mas a Igreja Católica e os sindicatos dizem que, no ano que agora terminou, foram mais de cem mil os cidadãos lusos a procurar emprego e melhor sorte além-fronteiras, o que corresponde a um aumento de 20 por cento em relação a 2005.

“O secretário de Estado das Comunidades disse há umas semanas que o fluxo migratório dos portugueses está a diminuir, mas o que nós observamos, através das nossas missões espalhadas pelo mundo, é que, ao contrário do que aconteceu entre meados da década de 90 e 2004, são cada vez mais os nossos compatriotas a procurarem lá fora a solução para os seus problemas financeiros e de emprego”, disse ao Correio da Manhã o padre Rui da Silva Pedro, o responsável pela Obra Católica Portuguesa das Migrações (OCPM), um organismo da Conferência Episcopal Portuguesa

Esta constatação da Igreja Católica é aprovada e até sublinhada por Manuel Carvalho da Silva, coordenador nacional da CGTP, para quem, em matéria de emigração, “os números do INE não correspondem minimamente à realidade”.

“É preciso não esquecer os milhares de portugueses que têm contratos sazonais, os muitos milhares que estão ilegais e os milhares que trabalham em Espanha, indo ao domingo e vindo à sexta-feira”, disse Carvalho da Silva.

A OCPM estima que só para o Reino Unido, no ano passado, tenham emigrado cerca de 40 mil portugueses, tornando–se assim, devido às vantagens cambiais, o destino preferido dos nossos emigrantes. Aliás, os últimos dados indicam que a comunidade lusa nas ilhas britânicas já deve passar as 400 mil pessoas.

Destino emergente para os portugueses é a Espanha, para onde vão trabalhar cada vez mais compatriotas nossos na construção civil. Os ordenados são mais altos e têm a possibilidade de vir a casa todos os fins-de-semana. Mas há também muita gente a fixar residência no país vizinho. Estima-se que, só na Galiza, já residam 40 mil portugueses.

Também a Suíça se mantém como grande destino da nossa emigração. Manuel Beja, conselheiro das comunidades portuguesas eleito pela Suíça, diz que, em 2006, “terão passado os Alpes, à procura de trabalho, cerca de 15 mil portugueses”.

“Nos últimos tempos criou-se a ideia de que Portugal tinha passado de país de emigrantes (exportador de mão-de-obra) para país de imigrantes (importador de mão-de-obra), o que não é verdade. Somos, de facto, um país de imigrantes, mas continuamos a ser também pátria de emigrantes”, diz o padre Rui da Silva Pedro, sublinhando que “o aumento do desemprego e o excessivo endividamento das famílias são as grandes causas do recente aumento da emigração”.

E o que é facto, diz o padre Rui Pedro, é que “a emigração voltou a fazer parte dos planos de vida de muitos jovens portugueses”.

“HÁ QUEM PASSE FOME”

Adão Mendes, coordenador da União dos Sindicatos de Braga, diz que há milhares de portugueses que são explorados e que vivem e trabalham em “péssimas condições” em vários países estrangeiros, nomeadamente em Espanha. “Nós temos conhecimento, através dos nossos camaradas espanhóis, que vão carrinhas de Portugal com pessoas que são colocadas em obras, de onde só saem para vir no fim-de-semana a Portugal e onde passam dias inteiros num regime que raia a escravatura”, disse.

Manuel Carvalho da Silva, coordenador nacional da CGTP, assegura, por seu lado, que “há muitos portugueses a viver situações dramáticas no estrangeiro, perante a passividade dos nossos governantes”. O padre Rui Pedro vai mais longe e diz que “há pessoas a passar fome” e que “só não são em maior número porque as missões ajudam no que podem”. O sacerdote revela que “os contornos da emigração portuguesa são cada vez mais parecidos com os que se viviam nos anos 60 e 70”.

GOVERNO ESQUECE COMUNIDADES

O padre Rui da Silva Pedro, que conhece a maioria das comunidades portuguesas espalhadas pelo Mundo e que todos os dias recebe informações dos 122 padres diocesanos que a Conferência Episcopal Portuguesa tem em 14 países, diz que “os nossos governantes, que vivem tão preocupados, e bem, a criar condições de integração aos imigrantes que nos procuram, estão a abandonar cada vez mais os seus cidadãos que procuram melhor vida no estrangeiro”.

Sem se referir em concreto ao encerramento de consulados e embaixadas, o sacerdote que mais sabe de emigração em Portugal não tem dúvidas de que “as comunidades portugueses nunca, no pós-25 de Abril, estiveram tão esquecidas pelo Governo português como agora”. A questão vai, aliás, ser abordada no próximo dia 14, Dia Mundial do Migrante e Refugiado.

SAIBA MAIS

QUASE CINCO MILHÕES

São cálculos da Obra Católica Portuguesa das Migrações: em 121 países do Mundo inteiro residem 4,8 milhões de portugueses, que anualmente enviam para o nosso país mais de dois mil milhões de euros.

122 MISSIONÁRIOS

A Conferência Episcopal Portuguesa tem, como missionários junto das nossas comunidades em 14 países, 122 sacerdotes. Conta ainda com a colaboração de 30 religiosas, 22 diáconos permanentes e 68 leigos com formação teológica.

SONHO CANADIANO

Apesar de todas as dificuldades de legalização dos portugueses no Canadá, amplamente noticiadas em finais de 2005 e início de 2006, os açorianos continuam a arriscar uma vida nova neste país da América do Norte. Trata-se de uma espécie de sonho americano que, muitas vezes, acaba em pesadelo.

 

Correio da Manhã, 5/01/2007

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