A PROPÓSITO DO DESPACHO NORMATIVO Nº 48/2005 De 11 de Agosto
O início deste ano lectivo foi claramente marcado pelo agravamento das condições de trabalho dos professores, já que a componente lectiva dos docentes cresceu, em geral, sete tempos lectivos e a permanência na escola para vinte e seis horas. Mas como se operou este verdadeiro ?milagre de multiplicação??
Até à reorganização curricular do ensino básico, as horas lectivas dos professores eram contabilizadas em segmentos de 50 minutos incluindo os dez minutos dos intervalos. Com a referida reforma, os professores passaram a ter que cumprir, na escola, a diferença dos cinquenta para os quarenta e cinco minutos, que representavam noventa minutos semanais que eram ocupados em tarefas de coordenação pedagógica, actividades de complemento curricular ou outras tarefas de carácter não obrigatório para os alunos.
Quando se operou a reorganização curricular do ensino secundário e a consequente passagem dos tempos de cinquenta para quarenta e cinco minutos este diferencial foi automaticamente convertido em tempos lectivos. Abriu-se assim o precedente para o actual ?milagre da multiplicação? dos horários docentes.
Concluindo, o referido despacho aumentou a carga lectiva dos professores em cerca de trinta por cento, essencialmente à custa das pausas não contabilizadas na componente lectiva. Usando como exemplo um horário de vinte e duas horas, o docente que teria vinte e dois tempos de cinquenta minutos mais os dez minutos de intervalo, ficaria com a sua componente lectiva completa. Com a aplicação do despacho, o horário de vinte e duas horas é transformado num horário de vinte e nove tempos lectivos, resultando numa diminuição das despesas da Secretaria Regional da Educação e Ciência, com pessoal docente, na proporção acima referida, ou mais, como se verá adiante e como consequência social o aumento do desemprego docente.
Quanto à questão das vinte e seis horas de permanência na escola parece-nos que o principal problema prende-se com a ausência de espaços e condições materiais, arriscava a dizer, em todas as escolas da região e, muito provavelmente, do país. Quando os governantes dão o exemplo dos países desenvolvidos para comparar as diferenças de cumprimento de horário na escola com o nosso país, esquecem que estamos ainda a meio caminho entre a ?escola do embondeiro? e uma ?verdadeira escola?, pois sabem perfeitamente que se os professores não trabalharem em casa, não têm meios para o fazer na escola. Aliás, este constitui o único motivo porque os docentes não cumprem as trinta e cinco horas na escola como qualquer funcionário público. O trabalho em casa, realizado com meios próprios é dinheiro poupado ao erário público.
O que ficou para os professores fazerem em nove horas semanais de trabalho ?individual? é impossível de realizar neste espaço de tempo, a saber: preparação das aulas, elaboração de fichas de diagnóstico, de fichas formativas e de testes de avaliação, correcção dos mesmos, reuniões de avaliação, reuniões no âmbito da disciplina e do departamento. Por outro lado, os professores ainda têm que cumprir no estabelecimento de ensino, a diferença entre as vinte e duas horas de efectiva leccionação contabilizados ao minuto e as vinte e seis horas, excedendo claramente o horário semanal de trinta e cinco horas.
Na verdade, este despacho permitiu a revogação do diploma equivalente que atribuía às escolas um crédito de horas para ser usado em apoios educativos e nas reduções da componente lectiva dos professores para o exercício de cargos de coordenação pedagógica o que permitiu mais uma poupança a somar à já referida. Pois o exercício dos referidos cargos com excepção da direcção de turma passam a ser exercidos na componente não lectiva e os apoios e substituições na componente lectiva ou para- lectiva(?).
Por último, fica aqui a dúvida: quem fala verdade? O Senhor Secretário ou o Presidente do Governo? Temos ou não dificuldades orçamentais?
António Lucas