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“Prova de ingresso” na carreira docente: Governo quer ocultar o desemprego de milhares de professores

 

 

A FENPROF denuncia que a sujeição de milhares de docentes a esta “prova de avaliação de conhecimentos e competências” mais não visa do que, através de um procedimento artificial, diminuir o número dos que o ME reconhece como professores, ocultando o altíssimo desemprego que atinge este grupo profissional. Desta forma, com uma “manipulação” dos números do desemprego, reduziria a pressão política e social que este problema provoca.

· Falamos de milhares de jovens que completaram com êxito cursos do ensino superior, a esmagadora maioria em áreas dedicadas precisamente à formação inicial de professores e educadores;

· Candidataram-se e matricularam-se nesses cursos porque são reconhecidos e certificados como cursos de formação para a docência.

· São jovens (e suas famílias) que investiram esforço pessoal e meios na frequência de cursos que os preparavam para serem professores ou educadores.

· Tiveram êxito nas provas exigidas, demonstrando que estavam à altura do oficialmente requerido para o exercício da profissão, o que incluiu, até, a realização de estágio pedagógico.

· São detentores de qualificações profissionais, de acordo com o que é determinado pela própria Lei de Bases do Sistema Educativo.

· Milhares destes docentes já têm até serviço prestado como professores e correm agora o risco de serem apanhados na armadilha que o Ministério da Educação (ME) concebeu.

· Se um dia conseguirem ingressar na carreira, apesar de todas as barreiras que estão criadas, serão sujeitos a um período probatório de duração mínima de um ano escolar que, segundo o próprio ME, “destina-se a verificar a capacidade de adequação do docente ao perfil de desempenho profissional exigível” (Decreto-Lei n.º 15/2007, de 19 de Janeiro).

AS JUSTIFICAÇÕES DO ME

Nas justificações que o ME avança para explicar a imposição da sua “prova de ingresso”, avulta a ideia de que criaria, assim, um dispositivo para “assegurar que o exercício efectivo de funções docentes fica reservado a quem possui todos os requisitos necessários a um desempenho profissional especializado e de grande qualidade” (Decreto Regulamentar n.º 3/2008, de 21 de Janeiro).

O esforço justificativo do ME pressupõe uma desconfiança indisfarçável no trabalho das instituições de ensino superior que fazem formação inicial de professores. Mas, ao invés de pretender actuar a este nível, com a “prova de ingresso” o ME força um novo constrangimento no acesso à profissão para quem já está profissionalmente habilitado para a exercer e, na prática, impõe um novo requisito habilitacional, à revelia da Lei de Bases do Sistema Educativo.

São de prever efeitos negativos que a “prova” acabará por ter na própria formação inicial de professores. A sua existência será, em muitos casos, um factor de condicionamento e afunilamento da formação. Face à reconhecida complexidade do exercício da profissão, são também muito discutíveis os atributos que uma “prova” desta natureza possa ter para seleccionar, como o ME pretende convencer, os melhores professores.

OCULTAÇÃO ESTATÍSTICA

Mesmo tendo em conta as condições de dispensa de realização da “prova de ingresso” que o ME definiu, estimamos que, para poderem concorrer ao ingresso na carreira, algumas dezenas de milhar de professores tenham de se sujeitar aos imponderáveis e condicionantes das duas ou três componentes possíveis da prova. A obtenção de classificação inferior a 14 (numa escala de 20!), em qualquer uma das componentes, está definida, desde logo, como um impedimento ao ingresso na carreira. As provas são realizadas em chamada única, pelo que até um qualquer imprevisto poderá eliminar a legítima pretensão de se ser professor? E, neste quadro, é grotesca, ainda, a intenção do ME em financiar o seu “dispositivo” com pagamentos exigidos aos que, sendo profissionalmente qualificados, podem vir a ser afastados da profissão.

A FENPROF denuncia, uma vez mais, que a sujeição de milhares de docentes a esta “prova de avaliação de conhecimentos e competências” mais não visa do que, através de um procedimento artificial, diminuir o número dos que o ME reconhece como professores, ocultando o altíssimo desemprego que atinge este grupo profissional. Desta forma, com uma “manipulação” dos números do desemprego, reduziria a pressão política e social que este problema provoca.

Num país em que o insucesso e o abandono escolares persistem e em que, por exemplo, as baixas qualificações continuam a ser um gravíssimo problema, existem cerca de trinta e cinco mil docentes no desemprego ou que têm de recorrer a outras ocupações em que as suas qualificações profissionais acabam por ser desperdiçadas. É um enorme problema que se arrasta e se agrava com as medidas tomadas pelo actual governo que quer, agora, introduzir um “dispositivo” de ocultação da sua verdadeira dimensão.

INSTABILIDADE E PRECARIEDADE
CARACTERIZAM PROFISSÃO

Esta “prova de ingresso” agiganta-se entre as profundas preocupações que assolam os jovens professores e educadores, pelo seu carácter radicalmente castrador de expectativas de futuro. É, para milhares deles, uma das preocupações maiores, mas nem sequer a única que marca o quadro de insuportável precariedade em que se movem.

Para além do enorme desemprego, ameaça constante para tantos professores e educadores, o actual governo não tem parado de acrescentar factores de instabilidade que negam, por completo, projectos de vida a tantos jovens. É assim que permanece sem resposta a exigência de um horizonte de vinculação para quem vai somando, uns atrás de outros, anos de serviço sem perspectiva de estabilidade. Ao invés, o Governo vai criando formas de contratação cada vez mais precárias, sujeitando a elas, de forma generalizada, os professores e educadores. Assim, têm sido promovidos, para largos milhares de docentes, contratos de prestação de serviços ilegais ? os falsos “recibos verdes”. E o ataque prossegue com os contratos administrativos de serviço docente a dar lugar aos contratos individuais de trabalho? Nas mãos do governo, triunfa a instabilidade e a precariedade.

Muito preocupante é, ainda, o facto de existirem estudos (Universidade de Aveiro) que evidenciam que a situação que hoje o ME considera de excesso de professores se inverterá, num futuro não muito distante, para uma situação de carência de recursos docentes. Com medidas penalizadoras como a da “prova de ingresso”, o Governo mais não faz do que antecipar o cenário, comprometendo o futuro do país. E, no presente, nega também o futuro dos jovens professores e educadores.

FENPROF EXIGE A REVOGAÇÃO DA “PROVA”

A consciência desta situação leva a FENPROF a insistir na necessidade de revogação imediata do Decreto Regulamentar n.º 3/2008, de 21 de Janeiro, bem como na alteração da redacção dos artigos 2º e 22º do Estatuto da Carreira Docente, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 15/2007, de 19 de Janeiro, que lhe deram origem. Esta é também a exigência de milhares de professores e educadores de infância dos quais seis mil subscreveram a “Carta Contra a Prova de Avaliação de Conhecimentos e Competências”, maioritariamente visados pela citada prova. É feita também em uníssono com os mais de cem mil professores e educadores portugueses que, no dia 8 de Março, na Marcha da Indignação, exigiram a renegociação do ECD também com este propósito.

Lisboa, 18 de Junho de 2008
O Secretariado Nacional da FENPROF

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