Quarta-feira, Julho 3, 2024
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Stresse e a profissão docente

Falar de Stresse, há duas décadas atrás era impensável e rondaria os laivos do ridículo porque até nem se sabia bem o que era. Seria talvez uma daquelas doenças que os Americanos, pioneiros da modernidade, teriam descoberto. Hoje, após a viragem de um novo milénio e de mais um século, a realidade é bem outra e a generalização, da já considerada como doença “o Stresse”, efectivou-se.
Inevitavelmente, o progresso e a modernidade têm os seus reflexos claros na sociedade, na família e, por efeito, na escola. Tudo vai acabar e começar na escola e, por consequência, nos professores, nos alunos, enfim, em toda a população escolar. Não vamos aqui debruçar – nos na população escolar mas apenas e só nos professores e partilhar algumas reflexões, que nos preocupam, como estrutura de defesa da nossa classe, e que são, em nosso entender, causadoras de elevados níveis de Stresse.
Durante muitos anos, a profissão “Professor” foi aliciante porque garantia estabilidade de emprego – ainda hoje alguns têm a ideia de que o Estado é o melhor patrão; – garantia estatuto e respeito social; até era uma profissão em que ” era reconhecida a necessidade de haver férias” de Natal, Carnaval, Páscoa e Verão para compensar o desgaste; em que a escolaridade obrigatória só ia até ao 2º Ano do Ciclo Preparatório -(hoje 5º e 6º Ano do Ensino Básico)-, quando actualmente vai até ao 9º Ano do Ensino Básico; Edifícios escolares que tinham espaços para tudo e todos, sem atropelos, ainda que, com poucos recursos materiais.
Com a publicação da Lei de Bases do Sistema Educativo, Dec. Lei 43/86, alargou-se a escolaridade obrigatória e com ela massificou-se o ensino. Coube e é exigido aos professores superar todas as diferenças individuais que chegam à escola; respeitar culturas e superar a eficiência dos média, compreender valores éticos, ter que ensinar a aprender e ensinar a pensar e ter até que ensinar a sonhar. Aqui residem os primeiros factores do Stresse. Em consequência de tudo isto as escolas não estavam preparadas para este ?Boom? de afluência à escolaridade, os espaços estão ultrapassados para o número de alunos, tudo serve para ser uma sala de aula, a escola deixou de ser convidativa pelo facto de as exigências não serem directamente proporcionais às necessidades dos alunos e à diversidade de interesses. Por outro lado, e em consequência de tudo isto,  o “conceito actual de Professor” alterou-se. Aos professores tudo se exige, por via da escola e da sociedade, sem um investimento, por parte do Ministério da Educação na sua Actualização / Formação Contínuas e reconhecimento material de todas estas exigências.
Os professores cada vez mais sentem o seu Estatuto desvalorizado; toda a sociedade tem os olhos postos neles; a sua avaliação não se faz só na Escola, pelos pares, mas pela sociedade em geral, que deles tudo exige. As relações interpessoais dentro das nossas escolas não são, por vezes, as melhores.
Hoje, numa análise muito realista, a profissão docente não é já por vocação mas um refúgio, por vezes, para aqueles que não tiveram nota para o curso desejado. Para muitos professores cada ano é uma incógnita. Aquele que era considerado um bom patrão – o Estado- neste momento não zela pelos seus trabalhadores; – a instabilidade de emprego é uma realidade sentida por muitos dos nossos colegas por vezes em situações bem melindrosas. Num ano está-se na escola, no ano seguinte de malas aviadas para irmos garantir uns meses de ordenado e de tempo de serviço a milhas de distância da residência. A própria entrada na profissão é de profundo desgaste.
Cada vez se exige mais às escolas. Há uma grande pressão social para o sucesso. A escola cultural é uma realidade. Estamos a deixar que a sociedade civil transfira para a escola as obrigações que são de toda a comunidade e não só dos professores. Os professores estão muito expostos. Nem todos têm “estofo” para aguentar todas estas pressões. Todos os dias chegam à escola novas realidades. Os professores todos os dias se sentem em “teste involuntário permanente”.
Combater o Stress que de tudo isto advém, implica lidar com estratégias que incidam sobre estes problemas. É necessário tentar mudar de atitudes em relação aos comportamentos de risco e até exercitar algum pensamento positivo em relação às nossas práticas.
Jorge Sampaio no seu Discurso de Abertura do VII Congresso Nacional da FENPROF dizia: “Há que repensar a Profissão Docente. Não se pode remeter para a escola toda a função social. – é necessário o reforço da colegialidade  docente,. preparar para novas competências e novas funções.; há necessidade de repensar em conjunto a ética da Profissão Docente de grande responsabilidade, grande complexidade, grandes distâncias, grandes desânimos e de grande Stresse.”
Temos que unir esforços e fazer valer as nossas convicções. Quando pedimos condições de trabalho nas escolas, reconhecimento pela Profissão Docente e direito ao trabalho estamos a exigir direitos reconhecidos até pelo primeiro Magistrado da Nação.

MARIA ÂNGELA AVILA
Delegação de S. Miguel

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