Sexta-feira, Março 29, 2024
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Grave ilegalidade nas grelhas de avaliação que estão a ser impostas na Região Autónoma dos Açores

Excelentíssimo Senhor
Presidente da República
Palácio de Belém
Praça Afonso Albuquerque
1300-004 LISBOA

Assunto: Grave ilegalidade nas grelhas de avaliação que estão a ser impostas na Região Autónoma dos Açores

Excelência,

A proposta de Decreto Regulamentar Regional (DRR) que contém o formulário de avaliação de desempenho do pessoal docente da Região Autónoma dos Açores – cujo rosto se anexa (Anexo 1) – contém, na página 6, no parâmetro 5, um item que, a ser respeitado, levaria a que se penalizassem, na sua avaliação, professores que faltem fazendo uso de direitos legalmente previstos e que equiparam essas faltas a serviço efectivo.

Referimo-nos ao item 5.1. Nível de assiduidade (Anexo 2), em que um docente cujas faltas sejam apenas as equiparadas a serviço efectivo deixa, de imediato, de ser classificado pela pontuação máxima (20) para lhe serem atribuídos apenas 14 pontos. Além disso, constata-se que só o docente que tenha faltado “até 2% das actividades lectivas que lhe estavam atribuídas, por ano, à excepção da licença parental e de adopção e não deu qualquer falta por conta do período de férias” é que é passível de receber a nota máxima neste item de avaliação.

Ou seja, estamos perante a penalização em termos de avaliação profissional dos docentes que faltem por ocasião do casamento (artigo 22.º do Decreto-Lei 100/99, de 31 de Março), por falecimento de familiar ou equiparado (artigo 28.º do Decreto-Lei 100/99, de 31 de Março), faltas para tratamento ambulatório, realização de consultas médicas e exames complementares de diagnóstico (artigo 53.º do Decreto-Lei 100/99, de 31 de Março), faltas para assistência a familiares (artigo 54.º do Decreto-Lei 100/99, de 31 de Março), faltas por motivos não imputáveis ao funcionário ou agente (artigo 70.º do Decreto-Lei 100/99, de 31 de Março), entre outras, nomeadamente as ausências por exercício do direito à greve ou participação em reuniões sindicais.

Ora, o regime legal previsto para estas faltas considera-as faltas justificadas e equiparadas a prestação de serviço efectivo. Isto é, o legislador quis dar protecção especial a determinadas situações que exigissem a violação do dever de assiduidade por parte do docente. Assim, ao reconhecer um conjunto de situações que justificam a falta do docente em termos de considerar os períodos correspondentes como serviço efectivo, o legislador reconhece expressamente uma protecção dos valores subjacentes às ausências em questão, a saber o direito à saúde e integridade física (artigo 25.º da Constituição da República Portuguesa), o direito a constituir família e contrair casamento (artigos 36.º, 67.º, n.º 1 e 68.º, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa), o direito à greve (artigo 57.º da Constituição da República Portuguesa), entre outros.

Este projecto de Decreto Regulamentar Regional (DRR) vem assim limitar o gozo de direitos, liberdades e garantias fundamentais do docente enquanto cidadão, previstos como tais pela Constituição Portuguesa. De facto, ao obrigar o docente, a optar entre uma avaliação máxima no item da assiduidade e faltar ao abrigo de uma das situações supra mencionadas, este projecto de DRR está a esvaziar de conteúdo um dos direitos aqui em conflito, sem que haja justificação legal para essa limitação.

Os docentes têm direito à sua valorização profissional como qualquer outro trabalhador nos termos do disposto no artigo 58.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa, também têm direito à organização do trabalho em condições socialmente dignificantes de tal forma que possibilite a realização pessoal do trabalhador, nos termos do disposto no artigo 59.º, n.º 1 da CRP. Realização pessoal que se afere, principalmente, pela conciliação da actividade profissional com a vida familiar o que não está salvaguardado neste projecto de DRR, caso venha a ser aprovado nos presentes moldes.

Todos os direitos supra mencionados gozam do regime de protecção especial previsto no artigo 18.º da Constituição da República Portuguesa e só poderão ser limitados, e sempre na medida do necessário, para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos, o que não acontece no presente caso.

Ao transformar as faltas já referidas num elemento de avaliação do docente, o Governo Regional dos Açores está a onerar, injustificadamente, a escolha do docente entre fazer uso do direito que tem em faltar justificadamente nos termos legalmente previstos e com equivalência a serviço efectivo ou em ser avaliado positivamente, com a cotação máxima, de forma a potenciar as hipóteses de progressão na carreira. O que, em nosso entender, se revela inconstitucional por se traduzir numa violação do disposto no artigo 18.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa.

Face ao que antes se expôs, a FENPROF vem solicitar a Vossa Excelência que se digne intervir junto da Assembleia Legislativa dos Açores e do seu Governo Regional, no sentido de impedir a aprovação desta grave ilegalidade.

Com os mais respeitosos cumprimentos

O Secretariado Nacional

Mário Nogueira

Secretário-Geral

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